A Primeira-Dama da República, Ana Dias Lourenço, exortou a juventude angolana a reflectir sobre os “ensinamentos bíblicos” deixados pelo maior genocida da história de Angola, Agostinho Neto, de modo a tornarem-se bons filhos, cidadãos e patriotas e – a fazer fé no exemplo do assassino – estarem sempre prontos a mandar, como aconteceu nos massacres de 27 de Maio de 1977, assassinar milhares e milhares de angolanos.
Por Orlando Castro
Ana Dias Lourenço, que discursava este sábado na cerimónia de lançamento do livro (de cariz religioso e de panegírico ao único herói nacional permitido pelo MPLA), intitulado “Culto Ecuménico de Acção de Graças”, alusivo ao centenário de António Agostinho Neto, partilhou com o público como surgiu a ideia de promover a iniciativa de transferir o culto ecuménico de 18 de Setembro de 2022, em Catete, para livro.
“Estávamos num culto que tinha como título ‘Angolanos em Cristo de mãos dadas para o futuro’. E naquele dia, nós tivemos a oportunidade de ouvir de servos do Senhor palavras que não só retrataram aquilo que são as palavras da Bíblia Sagrada, mas também conseguiram retratar o legado do nosso querido Presidente, Agostinho Neto. Fiquei muito tocada e assim pensei na ideia de se fazer um livro. Desafiei o meu marido, ainda em Catete”, contou.
Ana Dias Lourenço destacou que o livro passa uma mensagem de esperança para o futuro, carregada de sentimentos patrióticos, cristãos, de fé, de educação e ética, sobretudo para os mais novos. A Primeira-Dama agradeceu todos os envolvidos no projecto e pediu que os leitores recomendem a obra a demais angolanos.
Da autoria do Conselho de Igrejas Cristãs de Angola (CICA), o livro representa parte da vida e obra do – repita-se – maior genocida da História de Angola, Agostinho Neto, e foi lançado no Memorial Dr. António Agostinho Neto, em Luanda.
Para a socióloga Fátima Viegas, que fez a apresentação, não se trata apenas de um testemunho de fé, mas um tributo à vida e luta de um homem que dedicou a sua existência à liberdade e dignidade do povo angolano, razão pela qual – presume-se – mandou assassinar cerca de 80 mi angolanos nos massacres de 27 de Maio de 1977.
“Nos textos podemos destacar duas grandes linhas orientadoras para a nação angolana. Uma voltada para o passado, no sentido heróico da memória de vida e obra de Neto, e outra direccionada para o futuro próximo, orientação que remete-nos para a mística de sempre: a Sagrada Esperança”, precisou.
O evento, organizado pela comissão Inter Eclesial, contou com a presença de Maria Eugénia Neto, viúva do assassino Agostinho Neto, ministro da Cultura, Filipe Zau, e do arcebispo da Arquidiocese de Luanda, Filomeno do Nascimento Vieira Dias.
Marcaram igualmente presença o bispo Gaspar Domingos, da Igreja Metodista Unida, o secretário-geral da Aliança Evangélica de Angola, Alexandre Saúl, o secretário-geral do Conselho das Igrejas Cristãs em Angola, reverendo Vladimir Agostinho, entre outras entidades eclesiásticas.
Sabendo o que diz mas não dizendo o que sabe, tanto João Lourenço como Ana Dias Lourenço alinham na lavagem da imagem de Agostinho Neto numa altura em que, como sabe o regime, os angolanos começam cada vez mais a pensar com a cabeça e não tanto com a barriga… vazia.
Terá João Lourenço, ou Ana Dias Lourenço, alguma coisa a dizer aos angolanos sobre os acontecimentos ocorridos no dia 27 de Maio de 1977 e nos anos que se seguiram, quando cerca de 80 mil angolanos foram assassinados por ordem de Agostinho Neto?
Agostinho Neto, então Presidente da República, deu o tiro de partida na corrida do terror, ao dispensar o poder judicial, em claro desrespeito pela Constituição que jurara e garantia aos arguidos o direito à defesa. Fê-lo ao declarar, perante as câmaras da televisão, que não iriam perder tempo com julgamentos. Tal procedimento nem era uma novidade, pois, na história do MPLA tornara-se usual mandar matar os que se apontavam como “fraccionistas”.
O que terá a dizer sobre isto o agora Presidente da República, general João Lourenço ou a Primeira-Dama?
Agostinho Neto deixou a Angola (mesmo que João Lourenço e Ana Dias Lourenço utilizem toda a lixívia do mundo) o legado da máxima centralização de um poder incapaz de dialogar e de construir consensos, assim como de uma corrupção endémica. E os portugueses que nasceram e viveram em Angola, ainda hoje recordam o papel que teve na sua expulsão do país. Antes da independência declarava que os brancos que viviam em Angola há três gerações eram os “inimigos mais perigosos”. Em 1974, duvidava que os portugueses pudessem continuar em Angola. Em vésperas da independência convidava-os a sair do país. E já depois da independência, por altura da morte a tiro do embaixador de um país de Leste, cuja viatura não parara quando se procedia ao hastear da bandeira de Angola, dirigiu-se, pela televisão, aos camaradas, para lhes dizer que era preciso cuidado, pois nem todos os brancos eram portugueses.
Em Maio de 1977, não houve pioneirismo, pelo contrário, não tendo Agostinho Neto conseguido massacrar a humilhação passada no Congresso de Lusaka, o primeiro democrático do MPLA, onde o eleito foi Daniel Júlio Chipenda, Agostinho Neto consumou a grande chacina, para estancar, com o temor, uma série de cisões e problemas que calcorreavam incubados, desde a sua chegada ao MPLA, convidado pela anterior direcção.
Esta demonstração de força, serviu para demonstrar, que se o poder fosse posto em causa, a direcção e Agostinho Neto, não teriam pejo de sacrificar com a própria vida todos quantos intelectualmente o afrontassem. Foi assim ontem, é assim hoje, infelizmente, como bem sabe João Lourenço.
Numa só palavra, quando este MPLA sente o poder ameaçado, não hesita: humilha, assassina, destrói, elimina, atira aos jacarés.
É a sua natureza perversa demonstrando não estar o MPLA preparado para perder o poder e, em democracia, com a força do voto se isso vier a acontecer, a opção pela guerra será o recurso mais natural deste partido, não é general João Lourenço?
Não é em vão que temos dois exércitos: as FAA e o exército privado a UGP (Unidade de Guarda Presidencial), mais a partidarização da Polícia Nacional; da Segurança de Estado; do SIC (Serviços de Investigação Criminal); do sistema de Justiça e dos Tribunais e a maioria dos juízes, tudo previamente montado, para contrariar a vontade popular.
Em todos os meses do ano nunca devemos esquecer, por força do sofrimento de milhares e dos assassinatos de igual número, das prisões arbitrárias, da Comissão de Lágrimas, da Comissão de Inquérito, dos fuzilamentos indiscriminados, etc..
Muitos acreditaram, em 1979, que com a ascensão de Eduardo dos Santos ao poder, num eventual reencontro com a verdade e a reconciliação interna, sobre a alegada intentona, que ele próprio sabe nunca ter existido. Infelizmente, não se conseguiu despir da cobardia e cumplicidade, ostentada desde o tempo de Agostinho Neto e da sua clique: Lúcio Lara, Onambwé, Iko Carreira, Costa Andrade “Ndunduma”, Artur Pestana “Pepetela”, entre outros.
Dos Santos mostrou ser um homem que, pelo poder, foi capaz de tudo: violar a Constituição, as leis, humilhar, desonrar e assassinar, todos quantos não o bajulavam. Exemplos para quê, eles estão à mão de semear… nas cadeias, no exílio, nos cemitérios, no estômago dos jacarés. E João Lourenço está a mostrar-se um bom aluno desta cátedra.
“Não vamos perder tempo com julgamentos”, disse no pedestal da sua cadeira-baloiço, um dos maiores genocidas do nacionalismo angolano e da independência nacional, Agostinho Neto. João Lourenço sabe que isto é verdade, mas – apesar disso – enaltece o assassino e enxovalha a memória das vítimas.
Esta posição da lei da força, marcaria para todo o sempre o sistema judicial, judiciário e de investigação policial em Angola, onde a presunção e a defesa de uma ideologia diferente da do partido no poder, são causa bastante para acusação, julgamento, prisão e até mesmo assassinato político, ainda que a pena de morte, não esteja consagrada na Constituição.
Sempre que o regime diz o que agora repete João Lourenço (ou Anda Dias Lourenço), todos devemos fazer uma viagem de regresso a 1977 para ver como estão as cicatrizes daquele período de barbárie, que levou muitos de nós às fedorentas masmorras da polícia política de Agostinho Neto, ou mesmo aos assassinatos atrozes, como nunca antes o próprio colono português havia praticado contra muitos intelectuais pretos, sendo o próprio Neto disso um exemplo.
Desde 1977 que Angola, o Povo, aguarda pela justiça, mas com as mentes caducas no leme do país, essa magnanimidade de retractação mútua, para o sarar de feridas, não será possível, augurar uma Comissão da Verdade e Reconciliação, muito também, por não haver um líder em Angola.